Quando eu voltar, serei esta
seresta
a fazer fazeres
e festas
voltarei amiga
E me juntarei aos outros
como fazem as formigas
Quando eu voltar serei esta
de novo
...
Um cisne canta ao longe e morre baleado
Ao lado uma cadeira
Me interrogam
E eu não sei de nada
Só quero que tudo se acabe
No meu quarto,
Onde se vê o carpete verde mais feio do mundo
E mofado
Rosas cancerosas
Cogumelos
Rinite
E a Bíblia não explica o que há
Entre o céu e o banheiro...
Será uma tristeza, mas será uma tristeza por cima - como nunca tive antes - ouvindo Nessum Dorma e tomando Jack Daniels com suco de caju.
Antes burlesca que doente,
Não quererá chorar a toda hora
Falará impropérios, palavrões
Mandará o mundo ir tomar no cu
Mas será glamorosa e soberba
Uma tristeza pintada por Magritte
Surreal e nova
Obviamente fará poesias – como agora
Obviamente fracassará
E como todos os fracassados
Lerá Augusto dos Anjos
E lindamente reconhecerá em seus vermes
Seus bichinhos de estimação
Será a justa tristeza dos artistas que não ganham dinheiro
A tristeza sorridente do palhaço
Não a do garçom mau-humorado
E ela estará cercada pelo luxo abundante
Das riquezas humanas a que somos negados
Todos os dias
...
Me deram flores no dia em que morri
Até então eu só ganhava lilases nos olhos
Poeira de estrada
Vertigem de prenha
Nem oração, nem festa
Mas no dia em que morri
Me deram flores do campo
Brancas e amarelas
Um terço azul na mão
E uma Ave Maria na capela
E em vez de lilases nos olhos,
Lágrimas
Em vez de poeira,
Água benta
Em vez de vertigem
A sonolência de quem não se agüenta
De vontade de dormir
...
Me dá água preu me afogar na medida
Lá onde não dá pé
Passa essa cachaça safra péssima pra cá,
que quero morrer de não me lembrar
Vamos viver refém do menino-acaso?
Vítimas marítimas de um Sebastião revoltado?
Estigmas de um pé calejado...
Não volto hoje, estou afogado
Não volto nunca, meu mar foi calado
Lá, onde não dá pé
Onde os cinco sentidos falham
Quando a ressaca arremata
Mais um naufrágio
...
Traz a cidade pra mim
Com suas milongas e asfaltos
E seus saltos altos
Do alto dos vinhos
E salões de alabastro
Em La emborrachez de las noches
Locas e frias
Salta!
E traz os perfumes de Santelmo
Pra impregnar meus dias
Vai e volta logo
Com a cidade dos abraços nos braços
...
Não é preciso ir a novembro
Dobre agosto e vire em junho
Pois se bem lembro, meus cílios apontam
O norte de meu rosto, adjacência e punho
Dobrei meus sinos no meio do susto
Mil anos e o norte acordou num urro
Falo, desfaço, desfaleço em maio
Vejo o desgozo que é sentir-se nulo
Não é preciso ir a fevereiro
Quando janto, entardeço
O que é mim, noturno
...
Preciso escrever enlouquecidamente enquanto o pássaro de veludo pousa na minha cama. Fóssil. Sou eu em decomposição orgânica enquanto o tempo passa como um projétil. Rasga. Uma nesga de sol se apaga. Foi o inverno de Deus ou o sono da Via Láctea? Tudo correndo, um sábio desleixo do tempo, uma era, duas eras se passam em minhas palavras. Mil eras e já era o tempo! Venci! Não tenho mais que esperar por ele. Não preciso vencer mais nada...
...
É curioso como o mar arrebenta, o rebento no mar da placenta, serena, apascenta, a sirena em idade avançada, canta, mas sentada no pau das horas, ainda lamenta. E como vaga a onda do fundo do mar pra cá fora, a onda representa: protagonista. Faz firula demais prum caso, olha que é só mar ainda, mas levanta casco e quilha, faz espuma, marulho, estrondo, até que se arrebenta num palco de areia, bailarinas de um corpo-de-baile, foragidas do oceano fundo, com seu cântico de trovoada. Fecha o pano, ela se retira... mas logo vem outra. É curioso como o mar arrebenta.
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Tenho mesmo é competência para a desistência e para a total deselegância. Não tenho malandragem a um nível saudável. Estou ultra-passada por um trem bala-perdida que levou meu tempo real embora. Falo ao vivo de dentro do meu aquário de beta solitário e exótico. Meu tempo não é quando, muito menos hoje, e sempre, nunca será. Vendi minha alma na Lapa, num jogo de bilhar. Quem levou foi o primeiro que chegou, mangas de camisa e sorriso na testa. Acabou enfim a festa de doces bárbaros incrustados na areia da barra da saia de Marina Morena, pois quem venceu foi Bezerra. Me afogo no mar de pérolas aos porcos. Me afogo sempre, me jogo hoje. Vou ali jogar na cobra e já volto.
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Na vida, fui perdendo amigos
Perdendo o senso do impossível
Perdi a fala no meio do colóquio
Perdi a guerra pros sapos de escritório
Perdi a vergonha, o saco e o juízo
Perdi – vejam só – o senso do ridículo
Achei então minha lona de circo
Que armei bem no meio do meu umbigo
E agora o que sobra...
Sobrou só sombra torta
Que soçobra ao primeiro espirro
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Porque eu preciso de alento
Cavalgo esse vento
E me faço hiato
Nenhum pensamento
No porão, nenhum rato
Só os velhos esqueletos insones
Nenhuma paixão me consome
O vento me pega e me some
Agora, sou a fada do meu quintal
...
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Como pode ser
O momento em que nossas cores
Nossos fúnebres néons
Se espalham
Tão na transversal
Que trans versam
E colidem
Se partem
Partem
Se vão...
Um vinho velho foi arrolhado em meu ventre
As ruas não são chão
Ando com dificuldade pela cidadeArtrite
Artriste
Como se respira carvão?
Um lança-chamas tem mais carinho por nós
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